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sábado, 8 de janeiro de 2011

Cordéis do sorriso à medula!!!



De José Régio


Soneto quase inédito


Surge Janeiro frio e pardacento,
Descem da serra os lobos ao povoado;
Assentam-se os fantoches em São Bento
E o Decreto da fome é publicado.

Edita-se a novela do Orçamento;
Cresce a miséria ao povo amordaçado;
Mas os biltres do novo parlamento
Usufruem seis contos de ordenado.

E enquanto à fome o povo se estiola,
Certo santo pupilo de Loyola,
Mistura de judeu e de vilão,

Também faz o pequeno "sacrifício"
De trinta contos - só! - por seu ofício
Receber, a bem dele... e da nação.

JOSÉ RÉGIO Soneto escrito em 1969, no dia de uma reunião de antigos alunos.

Tão actual em 1969, como hoje...
E depois ainda dizem ...

(enviado por Amigo, Cineasta e Professor de Cinema. Marília)

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Perguntas à Espera de Resposta




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Assassinados pela PIDE

Símbolo da PIDEAssassinados pela PIDE

Numa altura em que nos querem fazer crer que o fascismo nunca existiu, e que Salazar era apenas "autoritário", numa altura em que querem apagar os poucos vestígios físicos que ainda existem, convém relembrar que o seu braço mais sinistro, a PIDE-DGS, bem como outros braços armados do fascismo, perseguiram, torturaram e assassinaram muitos portugueses e patriotas africanos, e que os seus responsáveis e agentes nunca foram punidos nem sequer julgados. Para reavivar a memória, voltamos a publicar excertos de um texto da Comissão "Abril Revolucionário e Popular" em 2002, o qual inclui uma lista de mortos pelo fascismo.

9 de Dezembro de 2005
A Página Vermelha
www.paginavermelha.org


  • 1931, o estudante Branco é morto pela PSP, durante uma manifestação no Porto;
  • 1932, Armando Ramos, jovem, é morto em consequência de espancamentos; Aurélio Dias, fragateiro, é morto após 30 dias de tortura; Alfredo Ruas, é assassinado a tiro durante uma manifestação em Lisboa;
  • 1934, Américo Gomes, operário, morre em Peniche após dois meses de tortura; Manuel Vieira Tomé, sindicalista ferroviário morre durante a tortura em consequência da repressão da greve de 18 de Janeiro; Júlio Pinto, operário vidreiro, morto à pancada durante a repressão da greve de 18 de Janeiro; a PSP mata um operário conserveiro durante a repressão de uma greve em Setúbal
  • 1935, Ferreira de Abreu, dirigente da organização juvenil do PCP, morre no hospital após ter sido espancado na sede da PIDE (então PVDE);
  • 1936, Francisco Cruz, operário da Marinha Grande, morre na Fortaleza de Angra do Heroísmo, vítima de maus tratos, é deportado do 18 de Janeiro; Manuel Pestana Garcez, trabalhador, é morto durante a tortura;
  • 1937, Ernesto Faustino, operário; José Lopes, operário anarquista, morre durante a tortura, sendo um dos presos da onda de repressão que se seguiu ao atentado a Salazar; Manuel Salgueiro Valente, tenente-coronel, morre em condições suspeitas no forte de Caxias; Augusto Costa, operário da Marinha Grande, Rafael Tobias Pinto da Silva, de Lisboa, Francisco Domingues Quintas, de Gaia, Francisco Manuel Pereira, marinheiro de Lisboa, Pedro Matos Filipe, de Almada e Cândido Alves Barja, marinheiro, de Castro Verde, morrem no espaço de quatro dias no Tarrafal, vítimas das febres e dos maus tratos; Augusto Almeida Martins, operário, é assassinado na sede da PIDE (PVDE) durante a tortura ; Abílio Augusto Belchior, operário do Porto, morre no Tarrafal, vítima das febres e dos maus tratos;
  • 1938, António Mano Fernandes, estudante de Coimbra, morre no Forte de Peniche, por lhe ter sido recusada assistência médica, sofria de doença cardíaca; Rui Ricardo da Silva, operário do Arsenal, morre no Aljube, devido a tuberculose contraída em consequência de espancamento perpetrado por seis agentes da Pide durante oito horas; Arnaldo Simões Januário, dirigente anarco-sindicalista, morre no campo do Tarrafal, vítima de maus tratos; Francisco Esteves, operário torneiro de Lisboa, morre na tortura na sede da PIDE; Alfredo Caldeira, pintor, dirigente do PCP, morre no Tarrafal após lenta agonia sem assistência médica;
  • 1939, Fernando Alcobia, morre no Tarrafal, vítima de doença e de maus tratos;
  • 1940, Jaime Fonseca de Sousa, morre no Tarrafal, vítima de maus tratos; Albino Coelho, morre também no Tarrafal; Mário Castelhano, dirigente anarco-sindicalista, morre sem assistência médica no Tarrafal;
  • 1941, Jacinto Faria Vilaça, Casimiro Ferreira; Albino de Carvalho; António Guedes Oliveira e Silva; Ernesto José Ribeiro, operário, e José Lopes Dinis morrem no Tarrafal;
  • 1942, Henrique Domingues Fernandes morre no Tarrafal; Carlos Ferreira Soares, médico, é assassinado no seu consultório com rajadas de metralhadora, os agentes assassinos alegam legítima defesa (?!); Bento António Gonçalves, secretário-geral do P. C. P. Morre no Tarrafal; Damásio Martins Pereira, fragateiro, morre no Tarrafal; Fernando Óscar Gaspar, morre tuberculoso no regresso da deportação; António de Jesus Branco morre no Tarrafal;
  • 1943, Rosa Morgado, camponesa do Ameal (Águeda), e os seus filhos, António, Júlio e Constantina, são mortos a tiro pela GNR; Paulo José Dias morre tuberculoso no Tarrafal; Joaquim Montes morre no Tarrafal com febre biliosa; José Manuel Alves dos Reis morre no Tarrafal; Américo Lourenço Nunes, operário, morre em consequência de espancamento perpetrado durante a repressão da greve de Agosto na região de Lisboa; Francisco do Nascimento Gomes, do Porto, morre no Tarrafal; Francisco dos Reis Gomes, operário da Carris do Porto, é morto durante a tortura;
  • 1944, general José Garcia Godinho morre no Forte da Trafaria, por lhe ser recusado internamento hospitalar; Francisco Ferreira Marques, de Lisboa, militante do PCP, em consequência de espancamento e após mês e meio de incomunicabilidade; Edmundo Gonçalves morre tuberculoso no Tarrafal; assassinados a tiro de metralhadora uma mulher e uma criança, durante a repressão da GNR sobre os camponeses rendeiros da herdade da Goucha (Benavente), mais 40 camponeses são feridos a tiro.
  • 1945, Manuel Augusto da Costa morre no Tarrafal; Germano Vidigal, operário, assassinado com esmagamento dos testículos, depois de três dias de tortura no posto da GNR de Montemor-o-Novo; Alfredo Dinis (Alex), operário e dirigente do PCP, é assassinado a tiro na estrada de Bucelas; José António Companheiro, operário, de Borba, morre de tuberculose em consequência dos maus tratos na prisão;
  • 1946, Manuel Simões Júnior, operário corticeiro, morre de tuberculose após doze anos de prisão e de deportação; Joaquim Correia, operário litógrafo do Porto, é morto por espancamento após quinze meses de prisão;
  • 1947, José Patuleia, assalariado rural de Vila Viçosa, morre durante a tortura na sede da PIDE;
  • 1948, António Lopes de Almeida, operário da Marinha Grande, é morto durante a tortura; Artur de Oliveira morre no Tarrafal; Joaquim Marreiros, marinheiro da Armada, morre no Tarrafal após doze anos de deportação; António Guerra, operário da Marinha Grande, preso desde 18 de Janeiro de 1934, morre quase cego e após doença prolongada;
  • 1950, Militão Bessa Ribeiro, operário e dirigente do PCP, morre na Penitenciária de Lisboa, durante uma greve de fome e após nove meses de incomunicabilidade; José Moreira, operário, assassinado na tortura na sede da PIDE, dois dias após a prisão, o corpo é lançado por uma janela do quarto andar para simular suicídio; Venceslau Ferreira morre em Lisboa após tortura; Alfredo Dias Lima, assalariado rural, é assassinado a tiro pela GNR durante uma manifestação em Alpiarça;
  • 1951, Gervásio da Costa, operário de Fafe, morre vítima de maus tratos na prisão;
  • 1954, Catarina Eufémia, assalariada rural, assassinada a tiro em Baleizão, durante uma greve, grávida e com uma filha nos braços;
  • 1957, Joaquim Lemos Oliveira, barbeiro de Fafe, morre na sede da PIDE no Porto após quinze dias de tortura; Manuel da Silva Júnior, de Viana do Castelo, é morto durante a tortura na sede da PIDE no Porto, sendo o corpo, irreconhecível, enterrado às escondidas num cemitério do Porto; José Centeio, assalariado rural de Alpiarça, é assassinado pela PIDE;
  • 1958, José Adelino dos Santos, assalariado rural, é assassinado a tiro pela GNR, durante uma manifestação em Montemor-o-Novo, vários outros trabalhadores são feridos a tiro; Raul Alves, operário da Póvoa de Santa Iria, após quinze dias de tortura, é lançado por uma janela do quarto andar da sede da PIDE, à sua morte assiste a esposa do embaixador do Brasil;
  • 1961, Cândido Martins Capilé, operário corticeiro, é assassinado a tiro pela GNR durante uma manifestação em Almada; José Dias Coelho, escultor e militante do PCP, é assassinado à queima-roupa numa rua de Lisboa;
  • 1962, António Graciano Adângio e Francisco Madeira, mineiros em Aljustrel, são assassinados a tiro pela GNR; Estêvão Giro, operário de Alcochete, é assassinado a tiro pela PSP durante a manifestação do 1º de Maio em Lisboa;
  • 1963, Agostinho Fineza, operário tipógrafo do Funchal, é assassinado pela PSP, sob a indicação da PIDE, durante uma manifestação em Lisboa;
  • 1964, Francisco Brito, desertor da guerra colonial, é assassinado em Loulé pela GNR; David Almeida Reis, trabalhador, é assassinado por agentes da PIDE durante uma manifestação em Lisboa;
  • 1965, general Humberto Delgado e a sua secretária Arajaryr Campos são assassinados a tiro em Vila Nueva del Fresno (Espanha), os assassinos são o inspector da PIDE Rosa Casaco e o subinspector Agostinho Tienza e o agente Casimiro Monteiro;
  • 1967, Manuel Agostinho Góis, trabalhador agrícola de Cuba, more vítima de tortura na PIDE;
  • 1968, Luís António Firmino, trabalhador de Montemor, morre em Caxias, vítima de maus tratos; Herculano Augusto, trabalhador rural, é morto à pancada no posto da PSP de Lamego por condenar publicamente a guerra colonial; Daniel Teixeira, estudante, morre no Forte de Caxias, em situação de incomunicabilidade, depois de agonizar durante uma noite sem assistência;
  • 1969, Eduardo Mondlane, dirigente da Frelimo, é assassinado através de um atentado organizado pela PIDE;
  • 1972, José António Leitão Ribeiro Santos, estudante de Direito em Lisboa e militante do MRPP, é assassinado a tiro durante uma reunião de apoio à luta do povo vietnamita e contra a repressão, o seu assassino, o agente da PIDE Coelha da Rocha, viria a escapar-se na "fuga-libertação" de Alcoentre, em Junho de 1975;
  • 1973, Amilcar Cabral, dirigente da luta de libertação da Guiné e Cabo Verde, é assassinado por um bando mercenário a soldo da PIDE, chefiado por Alpoim Galvão;
  • 1974, (dia 25 de Abril), Fernando Carvalho Gesteira, de Montalegre, José James Barneto, de Vendas Novas, Fernando Barreiros dos Reis, soldado de Lisboa, e José Guilherme Rego Arruda, estudante dos Açores, são assassinados a tiro pelos pides acoitados na sua sede na Rua António Maria Cardoso, são ainda feridas duas dezenas de pessoas.

A PIDE acaba como começou, assassinando. Aqui não ficam contabilizadas as inúmeras vítimas anónimas da PIDE, GNR e PSP em outros locais de repressão. Mas ainda podemos referir, duas centenas de homens, mulheres e crianças massacradas a tiro de canhão durante o bombardeamento da cidade do Porto, ordenada pelo coronel Passos e Sousa, na repressão da revolta de 3 de Fevereiro de 1927. Dezenas de mortos na repressão da revolta de 7 de Fevereiro de 1927 em Lisboa, vários deles assassinados por um pelotão de fuzilamento, à ordens do capitão Jorge Botelho Moniz, no Jardim Zoológico. Dezenas de mortos na repressão da revolta da Madeira, em Abril de 1931, ou outras tantas dezenas na repressão da revolta de 26 de Agosto de 1931. Um número indeterminado de mortos na deportação na Guiné, Timor, Angra e no Cunene. Um número indeterminado de mortos devido à intervenção da força fascista dos "Viriatos" na guerra civil de Espanha e a entrega de fugitivos aos pelotões de fuzilamento franquistas. Dezenas de mortos em São Tomé, na repressão ordenada pelo governador Carlos Gorgulho sobre os trabalhadores que recusaram o trabalho forçado, em Fevereiro de 1953. Muitos milhares de mortos durante as guerras coloniais, vítimas do Exército, da PIDE, da OPVDC, dos "Flechas", etc.

25 de Abril de 2002



Os tristes dias do nosso infortúnio

 
 
 
 
Os tristes dias do nosso infortúnio
29 Outubro2010  
Baptista Bastos  - b.bastos@netcabo.pt
 
 
 
Na terça-feira, 26 de Outubro, p.p., assistimos, estupefactos, a um
espectáculo deprimente. 
O dr. Cavaco consumiu vinte minutos, no Centro Cultural de Belém, a
esclarecer os portugueses que não havia português como ele. Os
portugueses, diminuídos com a presunção e esmagados pela soberba,
escutaram a criatura de olhos arregalados. Elogio em boca própria é
vitupério, mas o dr. Cavaco ignora essa verdade axiomática, como,
aliás, ignora um número quase infindável de coisas.
 
O discurso, além de tolo, era um arrazoado de banalidades, redigido
num idioma de eguariço. São conhecidas as amargas dificuldades que
aquele senhor demonstra em expressar-se com exactidão. Mas, desta
vez, o assunto atingiu as raias da nossa indignação. Segundo ele de si
próprio diz, tem sido um estadista exemplar, repleto de êxitos políticos e
de realizações ímpares. E acrescentou que, moralmente, é inatacável.
 
O passado dele não o recomenda. Infelizmente. Foi um dos piores
primeiros-ministros, depois do 25 de Abril. Recebeu, de Bruxelas,
oceanos de dinheiro e esbanjou-os nas futilidades de regime que,
habitualmente, são para "encher o olho" e cuja utilidade é duvidosa.
Preferiu o betão ao desenvolvimento harmonioso do nosso estrato
educacional; desprezou a memória colectiva como projecto ideológico,
nisso associando-se ao ideário da senhora Tatcher e do senhor Regan;
incentivou, desbragadamente, o culto da juventude pela juventude,
característica das doutrinas fascistas; crispou a sociedade portuguesa
com uma cultura de espeque e atrabiliária e, não o esqueçamos nunca,
recusou a pensão de sangue à viúva de Salgueiro Maia, um dos mais
abnegados heróis de Abril, atribuindo outras a agentes da PIDE, "por
serviços relevantes à pátria." A lista de anomalias é medonha.
 
Como Presidente é um homem indeciso, cheio de fragilidades e de
ressentimentos, com a ausência de grandeza exigida pela função. O
caso, sinistro, das "escutas a Belém" é um dos episódios mais vis da
história da II República. Sobre o caso escrevi, no Negócios, o que tinha
de escrever. Mas não esqueço o manobrismo nem a desvergonha,
minimizados por uma Imprensa minada por simpatizantes de
jornalismos e por estipendiados inquietantes. Em qualquer país do
mundo, seriamente democrático, o dr. Cavaco teria sido corrido a sete
pés. 
O lastro de opróbrio, de fiasco e de humilhação que tem deixado atrás
de si, chega para acreditar que as forças que o sustentam, a
manipulação a que os cidadãos têm sido sujeitos, é da ordem da
mancha histórica. E os panegíricos que lhe tecem são ultrajantes para
aqueles que o antecederam em Belém e ferem a nossa elementar
decência.
 
É este homem de poucas qualidades que, no Centro Cultural de Belém,
teve o descoco de se apresentar como símbolo de virtudes e sinónimo de
impolutabilidade. É este homem, que as circunstâncias determinadas
pelas torções da História alisaram um caminho sem pedras e
empurraram para um destino que não merece - é este homem sem jeito
de estar com as mãos, de sorriso hediondo e de embaraços múltiplos,
que quer, pela segunda vez, ser Presidente da nossa República. Triste
República, nas mãos de gente que a não ama, que a não desenvolve,
que a não resguarda e a não protege!
 
Estamos a assistir ao fim de muitas esperanças, de muitos sonhos
acalentados, e à traição imposta a gerações de homens e de mulheres. É
gente deste jaez e estilo que corrói os alicerces intelectuais, políticos e
morais de uma democracia que, cada vez mais, existe, apenas, na
superfície. O estado a que chegámos é, substancialmente, da
responsabilidade deste cavalheiro e de outros como ele.
 
Como é possível que, estando o País de pantanas, o homem que se
apresenta como candidato ao mais alto emprego do Estado, não tenha,
nem agora nem antes, actuado com o poder de que dispõe? Como é
possível? Há outros problemas que se põem: foi o dr. Cavaco que
escreveu o discurso? Se foi, a sua conhecida mediocridade pode ser
atenuante. Se não foi, há alguém, em Belém, que o quer tramar. 
 
Um amigo meu, fundador de PSD, antigo companheiro de Sá Carneiro e
leitor omnívoro de literatura de todos os géneros e projecções, que me
dizia: "Como é que você quer que isto se endireite se o dr. Cavaco e a
maioria dos políticos no activo diz 'competividade' em vez de
'competitividade' e julga que o Padre António Vieira é um pároco de
qualquer igreja?"
 
Pessoalmente, não quero nada. Mas desejava, ardentemente desejava,
ter um Presidente da República que, pelo menos, soubesse quantos
cantos tem "Os Lusíadas."
 
 
b.bastos@netcabo.pt
 

terça-feira, 4 de janeiro de 2011

AOS QUE TRAEM PORTUGAL E SEU POVO


 HERÓIS MORTOS PELA PÁTRIA

 (com os quais nada tens em comum)


  A TI TRAIDOR da PÁTRIA

Anda daí
meu safado
deixa a roupa
pelo caminho
e põe-me essa lama
a nu.
Tu alma? Tu és um bicho
que se fala
è por engano
da Natureza traída!
Tu és triste?
Ó fingimento!
Ó regabofe
da máscara que tu és
pr’além daquela que usas.
Ó puta de hipocrisia
falinhas mansas difusas
em charco de nostalgia.
Ó merda no meu caminho
que me atropelas os olhos
e fazes crescer no chão
o lodo apenas o lodo.
Lodo é pouco, podridão.

Marilia Gonçalves

ACUSO



ACUSO

Cavalo de vento
Meu dia perdido
O meu pensamento
Anda a soluçar
Por dentro do tempo
De cada gemido
Com olhos esquecidos
Do riso a cantar

Quem foi que levou
A ânfora antiga
Onde minha sede
Fui desalterar
Sementeira de astros
Que o olhar abriga
Por fora dos versos
Que hei-de procurar

Quem foi que em murmúrio
Na fonte gelava
Essa folha branca
Aonde pensar
Quem foi que a perdeu
Levando o futuro
Por onde o meu barco
não quer navegar

Quem foi que manchou
a página clara
Com água das sedes
Que eu hei-de contar
Quando o sol doirava
As velhas paredes
Da mansão perdida
De risos sem par

Quem foi que levou
Os astros azuis
Do meu tempo lindo
Meu tempo a vogar
Por mares de estrelas
Vermelhas abrindo
Quando minhas mãos
Querem soluçar

Não mais sei quem foi
só sei que foi quando
a noite vestiu o dia que era
E todos os sonhos
Partiram em bando
Fugindo de mim e da primavera

Mas há na memória
Da minha retina
A voz que se nega
A silenciar
Com dedo infantil
Erguendo a menina
Diante do réu
Em tempo e lugar!!!

Poema Anti-Nazi

 

 

 

 

 

 Alerta


Grita filha !

Há uma aranha
Na brancura da parede
Que peçonhenta tamanha
Vai tecendo sua rede.
Grita filha !
Essa fobia
É protecção natural
Contra a aranha sombria
Que além de símbolo
é mal !
Grita com todas as forças !
Grita porque há mesmo perigo
Essa aranha uma cruz negra
é o pior inimigo.
Por meu amor não te cales !
Grita filha
Tua mãe
Impele-te pra que fales :
Contigo grito também !
Essa aranha que se estende
Tem o passo marcial
Com fúria que surpreende
O incauto em voz fatal.
Grita filha
O bicho imundo
Sai vertiginosamente
Da sombra vinda do fundo
Em veneno de serpente.
Tal a jibóia medonha
Enrola-se abraça o mundo
Pra ir crescendo em peçonha.
Introduz-se em toda a parte
Tudo corrói e desfaz
É inimiga da Arte
Do Ser Humano da Paz.
Grita filha !
Mas tão alto
Num grito tão verdadeiro
Que desperte em sobressalto
O que não quer ver primeiro.
Essa aranha pestilenta
Odeia a própria Cultura
Em fogueira que alimenta
Livro após livro censura.
Opõe à Humanidade
A sua força brutal
Por onde ela passa invade
Mata o constitucional !
É um monstro repelente :
Primeiro ataca o mais fraco
Para ir seguidamente
Oculta em cada buraco
Destruir a Liberdade.
Inimiga da diferença !
Grita !
Minha filha Grita !
Faz ouvir tua presença.
Aponta o bicho feroz
Mostra-o sacode os amigos
Com a força da tua voz !
Grita !
Esse enredo de perigos !
Grita filha ! Desta vez
Esse grito é racional
Porque essa aranha é o não
Ao direito Universal.
Sem medo abre tua boca !
Grita alto ! Grita forte !
Porque toda a força é pouca
Para lutar contra a morte.
Grita ! Grita minha filha
não te cales nunca mais :
não se veja outra Bastilha
Prendendo os próprios jornais !
Que teu grito seja infindo
Circule dê volta ao mundo
Jovem voz entusiástica
Erguendo o povo profundo
Contra a bandeira suástica.


Marília Gonçalves





No tempo dos Cavalos

No tempo em que os cavalos
Tinham patas de vento
O vôo ultrapassava a dor
E as raízes
Quando sonhos azuis
não podiam montá-los
A desenhar o sulco
De térreas cicatrizes.
No tempo em que os cavalos
não escolhiam caminho
Levantavam as crianças
Do solo atraiçoado
No tempo dos cavalos
E das imperatrizes, as leis
Eram sombra de quem ia montado.
No tempo em que os cavalos
Desenharam memória
Da cor da sua cinza
Sobre a cinza dos dias
No tempo em que o terror
Era vê-los, olhá-los
Como vento a passar sobre histórias vazias.
No tempo em que os cavalos
Numa cidade inquieta
Galopavam no tempo
Que não queria parar
Uma mancha de sangue
Desenhava-se preta
Nos dias ressequidos
A perder-se no mar.
No tempo em que os cavalos
Eram maiores que a estrada
Havia vozes cegas
Ou olhos por gritar
No tempo em que eram monstros
Que vinham dispará-los
Sobre a esperança nascida
Que não queria murchar
No tempo dos cavalos
No tempo dos cavalos
Na Pátria ia crescendo
A raiva popular.

Marília Gonçalves



Marília Gonçalves nasceu em Lisboa viveu em Faro onde teve três filhos, a quarta nasceu na França. Vive perto de Paris. Desde menina demonstrou seu gosto pela palavra e pela poesia, declamando em Portugal e na França. Fez parte em 73/74 da Direção do Círculo Cultural do Algarve. Teve seus trabalhos publicados em vários jornais e revistas, como o Jornal do Algarve onde Teodomiro Neto fez o seu retrato. Está presente em vários sites de Internet:"Jornal de Poesia" "o Dono*o da Loja" "Uma página da comissão de Moradores de Palmela, "Estação de Palmela e Cabeço Velhinho", no Portal "Cá estamos Nós" e em "Sobresites", "Poetas del Mundo" cujo presidente Luis Arias Manzo é Embaixador Universal da Paz. Marília acredita na Humanidade e que saberá encontrar o Caminho para a Fraternidade e para a Paz. Tem obras publicadas num Livro de poesia " à Procura do Traço" e em duas Antologias "Elos de Poesia" e El Verbo Descerejado".