sexta-feira, 25 de março de 2011
quarta-feira, 23 de março de 2011
«Não à agressão contra a Líbia!» concentração hoje às 18h frente à «Não à agressão contra a Líbia!» concentração hoje às 18h frente à embaixada dos EUA (Sete Rios)Conselho Português para a Paz e Cooperação!embaixada dos EUA (Sete Rios)Conselho Português para a Paz e Cooperação!
Concentração frente à Embaixada dos EUA
Avenida dos Estados Unidos da América - Junto a Sete Rios Lisboa, Portugal | |||||||||||||||||||||||||||||||
Créé par : | |||||||||||||||||||||||||||||||
En savoir plus | Sob o pretexto e disfarce de «intervenção humanitária», estamos perante mais uma guerra de agressão e conquista por parte dos EUA e seus aliados da NATO e da região, com o aval do Conselho de Segurança das Nações Unidas. Como nos exemplos recentes dos Balcãs, do Iraque e do Afeganistão, mais uma vez, o verdadeiro móbil desta intervenção é o controlo dos recursos naturais e o domínio militar e político da região. Numa região marcad...a positivamente por importantes movimentações populares em luta por melhores condições de vida, por direitos sociais e laborais, liberdade e democracia e pela exigência de soberania e afirmação de independência face ao conluio de decadentes oligarquias com o imperialismo, as potências imperialistas buscam, em renovados moldes e por via da violência quando necessário, prosseguir a sua intromissão e exploração económica dos países desta região. É esse o cenário de sinistra ameaça sobre a Líbia hoje. No entretanto, conspiram contra os movimentos populares no Egipto e Tunísia e enviam forças militares da cruel ditadura Saudita para reprimirem a revolta popular no Bahrein. O CPPC, reafirmando a sua solidariedade com o povo líbio que será a primeira vítima desta agressão: - Condena a intervenção imperialista contra a Líbia e exige o fim imediato desta agressão em respeito pela independência e soberania deste país; - Deplora a co-responsabilidade assumida pelo Governo português nesta agressão, posto que votou favoravelmente a resolução do Conselho de Segurança das Nações Unidas; - No respeito pelo consagrado no artigo 7º da Constituição da República Portuguesa e na Carta das Nações Unidas, recusa liminarmente a participação de Portugal neste acto de agressão; - Solidariza-se com os povos da Líbia e do Bahrein vítimas de agressões imperialistas; - Expressa a sua grande apreensão quanto às repercussões que a presente acção terá sobre outros povos no Próximo e Médio Oriente. O CPPC convoca uma concentração de repúdio pelas agressões imperialistas aos povos da Líbia e do Bahrein e pela exigência da paz - frente à Embaixada dos EUA, em Lisboa (Avenida das Forças Armadas, junto a Sete Rios), para dia 23 de Março, Quarta-feira, pelas 18h00. O Conselho Português para a Paz e Cooperação 18 de Março de 2011 -------------------------- No to the aggression against Libya! Rally in front of the US Embassy in Lisbon March 23, Wednesday, at 6 p.m. Under the pretext and cover of a «humanitarian intervention», we are confronted with yet another war of aggression and conquer by the USA and its allies in NATO and in the region, with the go-ahead from the United Nations Security Council. As in the recent examples of the Balkans, Iraq and Afghanistan, once again the true motive for this intervention is the control of natural resources and the military and political domination of the region. In a region that has been positively marked by important popular movements in the struggle for better living standards, for social and labour rights, freedom and democracy and the demand for sovereignty, asserting independence in the face of the connivance of decadent oligarchies with imperialism, the imperialist powers are seeking to continue their interference and the economic exploitation of the countries of this region by new means and resorting to violence whenever necessary. This is the nature of the sinister threat that today hangs over Libya. In the meantime, they are conspiring against the popular movements in Egypt and Tunisia and they send the military forces of the cruel Saudi dictatorship to repress the people's revolt in Bahrein. CPPC, reaffirming its solidarity with the Libyan people, who will be the first victim of this aggression: Condemns the imperialist intervention against Libya and demands an immediate end to the aggression and respect for the independence and sovereignty of this country; Deplores the shared responsibility of the Portuguese government – that voted in favour of the United Nations Security Council Resolution – for this aggression; Respecting Article 7 of the Constitution of the Portuguese Republic and the United Nations Charter, unconditionally rejects Portugal's participation in this aggression; Expresses its solidarity with the peoples of Libya and Bahrein, who are the victims of imperialist aggressions; Expresses its great apprehension for the repercussions which the current action will have on other peoples in the Near and Far East. CPPC calls for a rally to repudiate the imperialist aggressions against the peoples of Libya and Bahrein and to demand peace, in front of the US Embassy in Lisbon, this Wednesday, March 23, at 6 p.m. The Portuguese Council for Peace and Cooperation March 18, 2011 |
quarta-feira, 16 de março de 2011
quinta-feira, 10 de março de 2011
PCP vai estar na manifestação da “Geração à rasca” dia 12 de Março
Marcada para dia 12 de Março
O secretário-geral do PCP Jerónimo de
Sousa afirma que o partido vai estar na manifestação do movimento de
precários “Geração à rasca”, marcada para dia 12 em vários pontos do
país. E afirma mesmo que o partido foi convidado a participar.
Jerónimo acusa o PSD de estar à espera de tomar o poder sem custos sociais (Carlos Lopes (arquivo))
quarta-feira, 9 de março de 2011
República Portuguesa
ARTIGO 21º DA CONSTITUIÇÃO PORTUGUESA
"Direito de resistência - Todos têm o direito de resistir a qualquer ordem que ofenda os seus direitos,
liberdades e garantias e de repelir pela força qualquer agressão, quando não seja possível recorrer à autoridade pública
sábado, 5 de março de 2011
As Portas que Abril Abriu José Carlos Ary dos Santos
Revolução
As Portas que Abril Abriu
José Carlos Ary dos Santos
Era uma vez um país
onde entre o mar e a guerra
vivia o mais infeliz
dos povos à beira-terra.
Onde entre vinhas sobredos
vales socalcos searas
serras atalhos veredas
lezírias e praias claras
um povo se debruçava
como um vime de tristeza
sobre um rio onde mirava
a sua própria pobreza.
Era uma vez um país
onde o pão era contado
onde quem tinha a raiz
tinha o fruto arrecadado
onde quem tinha o dinheiro
tinha o operário algemado
onde suava o ceifeiro
que dormia com o gado
onde tossia o mineiro
em Aljustrel ajustado
onde morria primeiro
quem nascia desgraçado.
Era uma vez um país
de tal maneira explorado
pelos consórcios fabris
pelo mando acumulado
pelas ideias nazis
pelo dinheiro estragado
pelo dobrar da cerviz
pelo trabalho amarrado
que até hoje já se diz
que nos tempos do passado
se chamava esse país
Portugal suicidado.
Ali nas vinhas sobredos
vales socalcos searas
serras atalhos veredas
lezírias e praias claras
vivia um povo tão pobre
que partia para a guerra
para encher quem estava podre
de comer a sua terra.
Um povo que era levado
para Angola nos porões
um povo que era tratado
como a arma dos patrões
um povo que era obrigado
a matar por suas mãos
sem saber que um bom soldado
nunca fere os seus irmãos.
Ora passou-se porém
que dentro de um povo escravo
alguém que lhe queria bem
um dia plantou um cravo.
Era a semente da esperança
feita de força e vontade
era ainda uma criança
mas já era a liberdade.
Era já uma promessa
era a força da razão
do coração à cabeça
da cabeça ao coração.
Quem o fez era soldado
homem novo capitão
mas também tinha a seu lado
muitos homens na prisão.
Esses que tinham lutado
a defender um irmão
esses que tinham passado
o horror da solidão
esses que tinham jurado
sobre uma côdea de pão
ver o povo libertado
do terror da opressão.
Não tinham armas é certo
mas tinham toda a razão
quando um homem morre perto
tem de haver distanciação
uma pistola guardada
nas dobras da sua opção
uma bala disparada
contra a sua própria mão
e uma força perseguida
que na escolha do mais forte
faz com que a força da vida
seja maior do que a morte.
Quem o fez era soldado
homem novo capitão
mas também tinha a seu lado
muitos homens na prisão.
Posta a semente do cravo
começou a floração
do capitão ao soldado
do soldado ao capitão.
Foi então que o povo armado
percebeu qual a razão
porque o povo despojado
lhe punha as armas na mão.
Pois também ele humilhado
em sua própria grandeza
era soldado forçado
contra a pátria portuguesa.
Era preso e exilado
e no seu próprio país
muitas vezes estrangulado
pelos generais senis.
Capitão que não comanda
não pode ficar calado
é o povo que lhe manda
ser capitão revoltado
é o povo que lhe diz
que não ceda e não hesite
- pode nascer um país
do ventre duma chaimite.
Porque a força bem empregue
contra a posição contrária
nunca oprime nem persegue
- é força revolucionária!
Foi então que Abril abriu
as portas da claridade
e a nossa gente invadiu
a sua própria cidade.
Disse a primeira palavra
na madrugada serena
um poeta que cantava
o povo é quem mais ordena.
E então por vinhas sobredos
vales socalcos searas
serras atalhos veredas
lezírias e praias claras
desceram homens sem medo
marujos soldados «páras»
que não queriam o degredo
dum povo que se separa.
E chegaram à cidade
onde os monstros se acoitavam
era a hora da verdade
para as hienas que mandavam
a hora da claridade
para os sóis que despontavam
e a hora da vontade
para os homens que lutavam.
Em idas vindas esperas
encontros esquinas e praças
não se pouparam as feras
arrancaram-se as mordaças
e o povo saiu à rua
com sete pedras na mão
e uma pedra de lua
no lugar do coração.
Dizia soldado amigo
meu camarada e irmão
este povo está contigo
nascemos do mesmo chão
trazemos a mesma chama
temos a mesma ração
dormimos na mesma cama
comendo do mesmo pão.
Camarada e meu amigo
soldadinho ou capitão
este povo está contigo
a malta dá-te razão.
Foi esta força sem tiros
de antes quebrar que torcer
esta ausência de suspiros
esta fúria de viver
este mar de vozes livres
sempre a crescer a crescer
que das espingardas fez livros
para aprendermos a ler
que dos canhões fez enxadas
para lavrarmos a terra
e das balas disparadas
apenas o fim da guerra.
Foi esta força viril
de antes quebrar que torcer
que em vinte e cinco de Abril
fez Portugal renascer.
E em Lisboa capital
dos novos mestres de Aviz
o povo de Portugal
deu o poder a quem quis.
Mesmo que tenha passado
às vezes por mãos estranhas
o poder que ali foi dado
saiu das nossas entranhas.
Saiu das vinhas sobredos
vales socalcos searas
serras atalhos veredas
lezírias e praias claras
onde um povo se curvava
como um vime de tristeza
sobre um rio onde mirava
a sua própria pobreza.
E se esse poder um dia
o quiser roubar alguém
não fica na burguesia
volta à barriga da mãe.
Volta à barriga da terra
que em boa hora o pariu
agora ninguém mais cerra
as portas que Abril abriu.
Essas portas que em Caxias
se escancararam de vez
essas janelas vazias
que se encheram outra vez
e essas celas tão frias
tão cheias de sordidez
que espreitavam como espias
todo o povo português.
Agora que já floriu
a esperança na nossa terra
as portas que Abril abriu
nunca mais ninguém as cerra.
Contra tudo o que era velho
levantado como um punho
em Maio surgiu vermelho
o cravo do mês de Junho.
Quando o povo desfilou
nas ruas em procissão
de novo se processou
a própria revolução.
Mas eram olhos as balas
abraços punhais e lanças
enamoradas as alas
dos soldados e crianças.
E o grito que foi ouvido
tantas vezes repetido
dizia que o povo unido
jamais seria vencido.
Contra tudo o que era velho
levantado como um punho
em Maio surgiu vermelho
o cravo do mês de Junho.
E então operários mineiros
pescadores e ganhões
marçanos e carpinteiros
empregados dos balcões
mulheres a dias pedreiros
reformados sem pensões
dactilógrafos carteiros
e outras muitas profissões
souberam que o seu dinheiro
era presa dos patrões.
A seu lado também estavam
jornalistas que escreviam
actores que se desdobravam
cientistas que aprendiam
poetas que estrebuchavam
cantores que não se vendiam
mas enquanto estes lutavam
é certo que não sentiam
a fome com que apertavam
os cintos dos que os ouviam.
Porém cantar é ternura
escrever constrói liberdade
e não há coisa mais pura
do que dizer a verdade.
E uns e outros irmanados
na mesma luta de ideais
ambos sectores explorados
ficaram partes iguais.
Entanto não descansavam
entre pragas e perjúrios
agulhas que se espetavam
silêncios boatos murmúrios
risinhos que se calavam
palácios contra tugúrios
fortunas que levantavam
promessas de maus augúrios
os que em vida se enterravam
por serem falsos e espúrios
maiorais da minoria
que diziam silenciosa
e que em silêncio fazia
a coisa mais horrorosa:
minar como um sinapismo
e com ordenados régios
o alvor do socialismo
e o fim dos privilégios.
Foi então se bem vos lembro
que sucedeu a vindima
quando pisámos Setembro
a verdade veio acima.
E foi um mosto tão forte
que sabia tanto a Abril
que nem o medo da morte
nos fez voltar ao redil.
Ali ficámos de pé
juntos soldados e povo
para mostrarmos como é
que se faz um país novo.
Ali dissemos não passa!
E a reacção não passou.
Quem já viveu a desgraça
odeia a quem desgraçou.
Foi a força do Outono
mais forte que a Primavera
que trouxe os homens sem dono
de que o povo estava à espera.
Foi a força dos mineiros
pescadores e ganhões
operários e carpinteiros
empregados dos balcões
mulheres a dias pedreiros
reformados sem pensões
dactilógrafos carteiros
e outras muitas profissões
que deu o poder cimeiro
a quem não queria patrões.
Desde esse dia em que todos
nós repartimos o pão
é que acabaram os bodos
- cumpriu-se a revolução.
Porém em quintas vivendas
palácios e palacetes
os generais com prebendas
caciques e cacetetes
os que montavam cavalos
para caçarem veados
os que davam dois estalos
na cara dos empregados
os que tinham bons amigos
no consórcio dos sabões
e coçavam os umbigos
como quem coça os galões
os generais subalternos
que aceitavam os patrões
os generais inimigos
os generais garanhões
teciam teias de aranha
e eram mais camaleões
que a lombriga que se amanha
com os próprios cagalhões.
Com generais desta apanha
já não há revoluções.
Por isso o onze de Março
foi um baile de Tartufos
uma alternância de terços
entre ricaços e bufos.
E tivemos de pagar
com o sangue de um soldado
o preço de já não estar
Portugal suicidado.
Fugiram como cobardes
e para terras de Espanha
os que faziam alardes
dos combates em campanha.
E aqui ficaram de pé
capitães de pedra e cal
os homens que na Guiné
aprenderam Portugal.
Os tais homens que sentiram
que um animal racional
opõe àqueles que o firam
consciência nacional.
Os tais homens que souberam
fazer a revolução
porque na guerra entenderam
o que era a libertação.
Os que viram claramente
e com os cinco sentidos
morrer tanta tanta gente
que todos ficaram vivos.
Os tais homens feitos de aço
temperado com a tristeza
que envolveram num abraço
toda a história portuguesa.
Essa história tão bonita
e depois tão maltratada
por quem herdou a desdita
da história colonizada.
Dai ao povo o que é do povo
pois o mar não tem patrões.
- Não havia estado novo
nos poemas de Camões!
Havia sim a lonjura
e uma vela desfraldada
para levar a ternura
à distância imaginada.
Foi este lado da história
que os capitães descobriram
que ficará na memória
das naus que de Abril partiram
das naves que transportaram
o nosso abraço profundo
aos povos que agora deram
novos países ao mundo.
Por saberem como é
ficaram de pedra e cal
capitães que na Guiné
descobriram Portugal.
E em sua pátria fizeram
o que deviam fazer:
ao seu povo devolveram
o que o povo tinha a haver:
Bancos seguros petróleos
que ficarão a render
ao invés dos monopólios
para o trabalho crescer.
Guindastes portos navios
e outras coisas para erguer
antenas centrais e fios
dum país que vai nascer.
Mesmo que seja com frio
é preciso é aquecer
pensar que somos um rio
que vai dar onde quiser
pensar que somos um mar
que nunca mais tem fronteiras
e havemos de navegar
de muitíssimas maneiras.
No Minho com pés de linho
no Alentejo com pão
no Ribatejo com vinho
na Beira com requeijão
e trocando agora as voltas
ao vira da produção
no Alentejo bolotas
no Algarve maçapão
vindimas no Alto Douro
tomates em Azeitão
azeite da cor do ouro
que é verde ao pé do Fundão
e fica amarelo puro
nos campos do Baleizão.
Quando a terra for do povo
o povo deita-lhe a mão!
É isto a reforma agrária
em sua própria expressão:
a maneira mais primária
de que nós temos um quinhão
da semente proletária
da nossa revolução.
Quem a fez era soldado
homem novo capitão
mas também tinha a seu lado
muitos homens na prisão.
De tudo o que Abril abriu
ainda pouco se disse
um menino que sorriu
uma porta que se abrisse
um fruto que se expandiu
um pão que se repartisse
um capitão que seguiu
o que a história lhe predisse
e entre vinhas sobredos
vales socalcos searas
serras atalhos veredas
lezírias e praias claras
um povo que levantava
sobre um rio de pobreza
a bandeira em que ondulava
a sua própria grandeza!
De tudo o que Abril abriu
ainda pouco se disse
e só nos faltava agora
que este Abril não se cumprisse.
Só nos faltava que os cães
viessem ferrar o dente
na carne dos capitães
que se arriscaram na frente.
Na frente de todos nós
povo soberano e total
que ao mesmo tempo é a voz
e o braço de Portugal.
Ouvi banqueiros fascistas
agiotas do lazer
latifundiários machistas
balofos verbos de encher
e outras coisas em istas
que não cabe dizer aqui
que aos capitães progressistas
o povo deu o poder!
E se esse poder um dia
o quiser roubar alguém
não fica na burguesia
volta à barriga da mãe!
Volta à barriga da terra
que em boa hora o pariu
agora ninguém mais cerra
as portas que Abril abriu!
domingo, 20 de fevereiro de 2011
quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011
CGTP-Contra o desemprego, as injustiças e as desigualdades, pela mudança de políticas.
|
terça-feira, 8 de fevereiro de 2011
ALERTA ANTIFASCISTA DO CAPITÃO DE ABRIL ANDRADE DA SILVA

DEMITIR ESTA CLASSE POLITICA COM QUEM E PARA QUÊ?
Como é fácil de verificar pela profusão de textos na página da manifestação de um milhão não é possível saber se há duas ideias semelhantes.
Todavia nenhum movimento com alguma ideia de mudança pode ter como objectivo a demissão de toda a classe política. É BONITO SOA BEM, mas é um mero devaneio poético, ou uma deriva totalitária. É algo que não faz sentido. É SUICIDÁRIO, porque o que há a fazer é dignificar a politica, criar um código ético do servidor público e pôr os políticos a trabalharem segundo politicas correctas e justas para o bem de todos os concidadãos.
Objectivamente seria importante premiar os políticos dignos, correr com os indignos, e exigir que os tribunais funcionassem rapidamente contra os corruptos, e seria também importante reconstruir a democracia participativa, mas nada disto se faz com uma, duas ou uma dezena de manifestações. É preciso muito mais, como seja organização, liderança.
Naturalmente que um movimento que hoje exige a demissão de toda a classe politica também pode pedir de todos os magistrados, militares, etc. seria o retomar da histórica luta do cidadão contra o estado, e o regresso ao bom selvagem de Rousseau, ou à anarquia que com o seu manto de liberdade total, esconde os piores déspotas e totalitários.
Todavia temos razão em querer que estes políticos se vão embora. O método proposto para alterar este desastre em que vivemos é que não será o eficaz, porque pede o impossível, o que é bom, estóico, motivador e mobilizador. Todavia a conquista do IMPOSSÍVEL tem um preço elevado, pode mesmo exigir o sacrifício da vida, e é sempre bom saber o que cada um, para além do ruído, é capaz de fazer.
O objectivo proposto parece de facto para quem quer fazer disto um jogo lúdico de facebook, que nas actuais circunstâncias seduz muita gente, porque quanto mais demagógica e estonteante for a proposta mais seduz faixas de pessoas desesperadas, e pode até vir ocupar a rua, como já fizeram os camionistas e a comissão de utentes da ponte. Podem não mudar toda a classe politica, mas provocar perturbações que levem à queda do governo. Preocupantemente nesta iniciativa está presente na página, como se pode verificar, a frente portuguesa com adeptos que transportam a bandeira nazi, logo…
andrade da silva
quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011
Comunicado do PCP sobre as Presidenciais 2011
COMUNICADO SOBRE AS ELEIÇÕES PRESIDENCIAIS NA EMIGRAÇÃO
A campanha para as eleições presidenciais de 23 de Janeiro e os seus resultados, confirmam
plenamente a importância da decisão do PCP de intervir, com uma voz própria e autónoma, no
debate e esclarecimento sobre a situação do País e os seus responsáveis, o papel e poderes
exigidos ao Presidente da República e a imperiosa necessidade de uma ruptura com a política
de direita capaz de abrir caminho a um Portugal mais desenvolvido, justo e soberano.
A candidatura de Francisco Lopes assumiu-se nestas eleições como a alternativa a Cavaco
Silva e à política de direita, com que este está comprometido, e a votação que obteve constitui
uma inequívoca afirmação de combatividade e de exigência de uma profunda mudança na vida
nacional. Este apoio contará, como nenhum outro, para a necessária e imprescindível
continuação da luta contra as injustiças e o processo de declínio nacional para o qual PS, PSD,
CDS e Cavaco Silva têm arrastado o País.
A incompetência e o desrespeito do Governo PS/Sócrates ficaram, uma vez mais,
demonstrados quer na elaboração dos Cadernos Eleitorais enviados para os Consulados, de
onde desapareceram eleitores que sempre votaram, quer pela falta de uma campanha de
incentivo ao recenseamento e de esclarecimento aos eleitores que tiraram o seu Cartão de
Cidadão em Portugal, ficando aqui recenseados e deixando de poder votar nos países onde se
encontram.
A fraquíssima participação no acto eleitoral – 5,3% - confirma a justa exigência do PCP para
que as autoridades portuguesas criem as condições necessárias para os emigrantes
exercerem os seus direitos cívicos, respeitando assim a Constituição da República.
Os resultados eleitorais da candidatura de Francisco Lopes nas Comunidades Portuguesas
confirmam a justeza da decisão tomada e a campanha eleitoral mobilizou as organizações,
camaradas e amigos, para uma maior intervenção na defesa dos direitos dos emigrantes, na
participação na vida nacional, na luta por um Portugal desenvolvido, independente e
progressista.
Esta batalha eleitoral faz parte das batalhas mais amplas que o PCP está a travar contra a
política do actual Governo, com o apoio explícito do Presidente da República; faz parte da luta
que travamos por uma política que defenda os interesses das nossas comunidades, que
respeite os direitos laborais, as carreiras dos funcionários consulares, dos assistentes sociais e
dos professores; faz parte da luta que promova a nossa cultura e língua e valorize o movimento
associativo como parte integrante da nossa identidade e como veículo de divulgação de
Portugal; faz parte da exigência de uma forte valorização das remessas dos emigrantes,
necessárias ao combate ao défice e ao desenvolvimento do país.
Estas eleições foram uma batalha pelos ideais libertadores do 25 de Abril, pela construção dum
Portugal soberano, alicerçado na dignidade da pessoa humana e na vontade popular,
empenhado na construção de uma sociedade livre, justa e solidária.
A LUTA CONTINUA!
A Direcção da Organização na Emigração (DOE) do PCP saúda todos os eleitores que deram a
sua confiança à candidatura de Francisco Lopes, garantindo-lhes que este foi um voto certo, o
voto que o PCP respeitará, em todas as circunstâncias, na luta pela defesa dos direitos dos
emigrantes.
A DOE do PCP saúda muito particularmente os seus militantes, os amigos e simpatizantes que,
com o seu trabalho, fizeram chegar a voz e as propostas do PCP a todos os cantos do Mundo.
A DOE do PCP
31 Janeiro de 2011
segunda-feira, 31 de janeiro de 2011
EGIPTO HOJE
Manifestantes são atacados pela polícia egípcia na ponte Qasr al-Nil, perto da Praça Tahrir, no Cairo, em 28 de janeiro. por Robert Fisk/The Guardian Tradução: Coletivo Vila Vudu/São Paulo |
Pode ser o fim. Com certeza é o começo do fim. Em todo o Egito, dezenas de milhares de árabes
enfrentaram gás lacrimogêneo, canhões de água, granadas e tiroteio para exigir
o fim da ditadura de Hosni Mubarak depois de mais de 30 anos.
Enquanto Cairo mergulha em nuvens de gás lacrimogêneo das
milhares de granadas lançadas contra multidões compactas,
era como se a ditadura de Mubarak realmente andasse rumo ao fim
. Ninguém, dos que estávamos ontem nas ruas do Cairo
, tínhamos nem ideia de por onde andaria Mubarak –
que mais tarde apareceria na televisão, para demitir
todos seus ministros. Nem encontrei alguém preocupado com Mubarak.
Eram dezenas de milhares, valentes, a maioria pacíficos,
mas a violência chocante dos battagi – em árabe,
a palavra significa literalmente “bandidos” – uniformizados
sem uniforme das milícias de Mubarak, que espancaram,
agrediram e feriram manifestantes, enquanto os guardas
apenas assistiam e nada fizeram, foi uma desgraça.
Esses homens, quase todos dependentes de drogas
e ex-policiais, eram ontem a linha de frente do Estado egípcio.
Os verdadeiros representantes de Hosni Mubarak.
Num certo momento, havia uma cortina de gás lacrimogêneo
por cima das águas do Nilo, enquanto as milícias antitumultos
e os manifestantes combatiam sobre as grandes pontes sobre
o rio. Incrível. A multidão levantou-se e não mais aceitará a
violência, a brutalidade, as prisões, como se essa fosse a
parte que lhe coubesse na maior nação árabe do planeta.
Os próprios policiais pareciam saber que estavam sendo derrotados.
“E o que podemos fazer?” – perguntou-nos um dos guardas
das milícias antitumulto. “Cumprimos ordens. Pensam
que queremos isso? Esse país está despencando ladeira abaixo
.” O governo impôs um toque de recolher noite passada.
A multidão ajoelhou-se para rezar, à frente da polícia.
Como se descreve um dia que pode vir a ser página gigante
da história do Egito? Os jornalistas devem abandonar as análises
e apenas narrar o que aconteceu da manhã à noite, numa das cidades
mais antigas do mundo. Então, aí está a história como a anotei,
garatujada no meio da multidão que não se rendeu a milhares d
e policiais uniformizados da cabeça aos pés e e milicianos sem uniforme.
Começou na mesquita Istikama na Praça Giza: um sombrio conjunto
de apartamentos de blocos de concreto, e uma fileira de policias
especializados em controle de tumultos que se estendia até o Nilo.
Todos sabíamos que Mohamed ElBaradei ali estaria para as orações
do meio dia e, de início, parecia que não haveria muita gente.
Os policiais fumavam. Se fosse o fim do reinado de Mubarak,
aquele começo do fim pouco impressionava.
Mas então, logo que as últimas orações terminaram,
uma multidão de fiéis apareceu na rua, andando em
direção aos policiais. “Mubarak, Mubarak”, gritavam,
“a Arábia Saudita o espera”. Foi quando os canhões de água
foram virados na direção da multidão – a polícia estava
organizada para atacar os manifestantes, mesmo
não sendo atacada. A água atingiu a multidão e em seguida
os canhões foram apontados diretamente contra ElBaradei,
que retrocedeu, encharcado.
ElBaradei desembarcara de Viena poucas horas antes,
e poucos egípcios creem que chegue a governar o Egito
– diz que só veio para ajudar como negociador –,
mas foi atacado com brutalidade, uma desgraça
. O político egípcio mais conhecido e respeitado, Prêmio Nobel,
trabalhou como principal inspetor da Agência Nuclear da ONU,
ali, encharcado como gato de rua. Creio que,
para Mubarak, ElBaradei
não passaria de mais um criador de confusão,
com sua “agenda oculta” –
essa, precisamente, é a linguagem que o governo egípcio fala hoje.
Aí, começaram as granadas de gás lacrimogêneo.
Alguns milhares delas, mas algo aconteceu,
enquanto eu caminhava ao lado dos lança-granadas.
Dos blocos de apartamentos e das ruas à volta,
de todas as ruas e ruelas, centenas, depois
de milhares de pessoas começaram a aparecer,
todas andando em direção à Praça Tahrir. Era o movimento
que a polícia queria impedir. Milhares de cidadãos em
manifestação no coração da cidade do Cairo daria a impressão
de que o governo já caíra. Já haviam cortado a internet –
o que isolou o Egito, do resto do mundo –
e todos os sinais de telefonia celular estavam mudos. Não fez diferença.
“Queremos o fim do regime”, gritavam as ruas.
Talvez não tenha sido o mais memorável
brado revolucionário, mas gritaram e gritaram e repetiram,
até derrotar a chuva de granadas de gás lacrimogêneo.
Vinham de todos os lados da cidade do Cairo,
chegavam sem parar, jovens de classe média de Gazira,
os pobres das favelas de Beaulak al-Daqrour, todos marchando
pelas pontes sobre o Nilo, como um exército. Acho que sim, são um exército.
A chuva de granadas de gás continuava sobre eles.
Tossiam e esfregavam os olhos e continuavam andando.
Muitos cobriram a cabeça e a boca com casacos e camisetas
, passando em fila pela frente de uma loja de sucos,
onde o dono esguichava limonada diretamente na boca dos passantes.
Suco de limão – antídoto contra os efeitos do
gás lacrimogêneo – escorria pela calçada e descia pelo esgoto.
Foi no Cairo, claro, mas protestos idênticos aconteceram por todo o Egito,
como em Suez, onde já há 13 egípcios mortos.
As manifestações não começaram só nas mesquitas,
mas também nas igrejas coptas. “Sou cristão, mas antes sou egípcio”
– disse-me um homem, Mina. “Quero que Mubarak se vá!”
E foi quando apareceram os primeiros bataggi sem uniforme,
abrindo caminho até a frente das fileiras da polícia uniformizada,
para atacar os manifestantes. Estavam armados com cassetetes de metal
– onde conseguiram? – e barras de ferro, e poderão ser julgados e condenados por agressão grave e assassinato, se o regime de Mubarak cair. São pervertidos. Vi um homem chicotear um jovem pelas costas,
com um longo cabo amarelo. O rapaz gritou de dor. Por toda a cidade
, os policiais uniformizados andam em pelotões, o sol refletindo no
visor dos capacetes. A multidão já deveria ter sido intimidada
, àquela altura, mas a polícia parecia feia, como pássaros encapuzado
s. E os manifestantes alcançaram a calçada da margem leste do Nilo.
Alguns turistas foram colhidos de surpresa no meio do espetáculo –
vi três senhoras de meia idade, numa das pontes do Nilo (os hotéis,
claro, não informaram os hóspedes sobre o que estava acontecendo –,
mas a polícia decidiu que fecharia a extremidade leste do viaduto.
Dividiram-se outra vez, para deixar passar as milícias não uniformizadas,
e esses brutamontes atacaram a primeira fileira dos manifestantes.
E foi quando choveu a maior quantidade de granadas de gás, centenas de granadas,
em vários pontos, contra a multidão que andava sem parar por todas as grandes vias
, em direção cidade. Os olhos ardem, e tosse-se horrivelmente, até perder o fôlego
. Alguns homens vomitavam nas soleiras das portas fechadas das lojas.
O fogo começou, ao que se sabe, noite passada, na sede do NDP,
Partido Democrático Nacional, partido de Mubarak. O governo impôs
um toque de recolher, e há relatos de tropas na cidade, sinal grave
de que a polícia pode ter perdido o controle dos acontecimentos.
Nos abrigamos no velho Café Riche, perto da Praça Telaat Harb,
restaurante e bar minúsculo, com garçons vestidos de azul; e ali,
tomando café, estava o grande escritor egípcio Ibrahim Abdul Meguid,
bem ali à nossa frente. Foi como dar de cara com Tolstoi, almoçando
em plena revolução russa. “Mubarak está sem reação!” – festejou ele.
“É como se nada estivesse acontecendo. Mas vai, agora vai.
O povo fará acontecer!” Sentamos, ainda tossindo e chorando
por causa do gás. Foi desses instantes memoráveis, que acontecem
mais em filmes que na vida real.
E havia um velho na calçada, cobrindo os olhos com a mão.
Coronel da reserva Weaam Salim do exército do Egito,
que saiu para a rua com todas as suas medalhas
da guerra de 1967 contra Israel – que o Egito perdeu –
e da guerra de 1973 que, para o coronel, o Egito venceu.
“Estou deixando o piquete dos soldados veteranos” – disse-me ele
. “Vou-me juntar aos manifestantes”. E o exército? Não se viram soldados
do exército durante todo o dia. Os coronéis e brigadeiros
mantêm-se em silêncio. Estarão à espera da lei marcial de Mubarak?
As multidões não obedeceram ao toque de recolher. Em Suez,
caminhões da polícia foram incendiados. Bem à frente
do meu hotel, tentaram jogar no rio Nilo um caminhão da Polícia.
Não consegui voltar à parte ocidental do Cairo pelas pontes.
As granadas de gás ainda empesteiam as margens do Nilo.
Mas um policial ficou com pena de nós –
emoção absolutamente inexistente, devo dizer, ontem,
entre os policiais – e nos guiou até a margem do rio.
E ali estava uma velha lancha egípcia a motor, de levar turistas,
com flores plásticas e proprietário disponível. Voltamos em grande estilo,
bebendo Pepsi. Cruzamos com uma lancha amarela, super rápida, da qua
l dois homens faziam sinais de vitória para a multidão sobre as pontes.
Uma jovem, sentada na parte de trás da lancha, carregava uma imensa bandeira: a bandeira do Egito.
enfrentaram gás lacrimogêneo, canhões de água, granadas e tiroteio para exigir
o fim da ditadura de Hosni Mubarak depois de mais de 30 anos.
Enquanto Cairo mergulha em nuvens de gás lacrimogêneo das
milhares de granadas lançadas contra multidões compactas,
era como se a ditadura de Mubarak realmente andasse rumo ao fim
. Ninguém, dos que estávamos ontem nas ruas do Cairo
, tínhamos nem ideia de por onde andaria Mubarak –
que mais tarde apareceria na televisão, para demitir
todos seus ministros. Nem encontrei alguém preocupado com Mubarak.
Eram dezenas de milhares, valentes, a maioria pacíficos,
mas a violência chocante dos battagi – em árabe,
a palavra significa literalmente “bandidos” – uniformizados
sem uniforme das milícias de Mubarak, que espancaram,
agrediram e feriram manifestantes, enquanto os guardas
apenas assistiam e nada fizeram, foi uma desgraça.
Esses homens, quase todos dependentes de drogas
e ex-policiais, eram ontem a linha de frente do Estado egípcio.
Os verdadeiros representantes de Hosni Mubarak.
Num certo momento, havia uma cortina de gás lacrimogêneo
por cima das águas do Nilo, enquanto as milícias antitumultos
e os manifestantes combatiam sobre as grandes pontes sobre
o rio. Incrível. A multidão levantou-se e não mais aceitará a
violência, a brutalidade, as prisões, como se essa fosse a
parte que lhe coubesse na maior nação árabe do planeta.
Os próprios policiais pareciam saber que estavam sendo derrotados.
“E o que podemos fazer?” – perguntou-nos um dos guardas
das milícias antitumulto. “Cumprimos ordens. Pensam
que queremos isso? Esse país está despencando ladeira abaixo
.” O governo impôs um toque de recolher noite passada.
A multidão ajoelhou-se para rezar, à frente da polícia.
Como se descreve um dia que pode vir a ser página gigante
da história do Egito? Os jornalistas devem abandonar as análises
e apenas narrar o que aconteceu da manhã à noite, numa das cidades
mais antigas do mundo. Então, aí está a história como a anotei,
garatujada no meio da multidão que não se rendeu a milhares d
e policiais uniformizados da cabeça aos pés e e milicianos sem uniforme.
Começou na mesquita Istikama na Praça Giza: um sombrio conjunto
de apartamentos de blocos de concreto, e uma fileira de policias
especializados em controle de tumultos que se estendia até o Nilo.
Todos sabíamos que Mohamed ElBaradei ali estaria para as orações
do meio dia e, de início, parecia que não haveria muita gente.
Os policiais fumavam. Se fosse o fim do reinado de Mubarak,
aquele começo do fim pouco impressionava.
Mas então, logo que as últimas orações terminaram,
uma multidão de fiéis apareceu na rua, andando em
direção aos policiais. “Mubarak, Mubarak”, gritavam,
“a Arábia Saudita o espera”. Foi quando os canhões de água
foram virados na direção da multidão – a polícia estava
organizada para atacar os manifestantes, mesmo
não sendo atacada. A água atingiu a multidão e em seguida
os canhões foram apontados diretamente contra ElBaradei,
que retrocedeu, encharcado.
ElBaradei desembarcara de Viena poucas horas antes,
e poucos egípcios creem que chegue a governar o Egito
– diz que só veio para ajudar como negociador –,
mas foi atacado com brutalidade, uma desgraça
. O político egípcio mais conhecido e respeitado, Prêmio Nobel,
trabalhou como principal inspetor da Agência Nuclear da ONU,
ali, encharcado como gato de rua. Creio que,
para Mubarak, ElBaradei
não passaria de mais um criador de confusão,
com sua “agenda oculta” –
essa, precisamente, é a linguagem que o governo egípcio fala hoje.
Aí, começaram as granadas de gás lacrimogêneo.
Alguns milhares delas, mas algo aconteceu,
enquanto eu caminhava ao lado dos lança-granadas.
Dos blocos de apartamentos e das ruas à volta,
de todas as ruas e ruelas, centenas, depois
de milhares de pessoas começaram a aparecer,
todas andando em direção à Praça Tahrir. Era o movimento
que a polícia queria impedir. Milhares de cidadãos em
manifestação no coração da cidade do Cairo daria a impressão
de que o governo já caíra. Já haviam cortado a internet –
o que isolou o Egito, do resto do mundo –
e todos os sinais de telefonia celular estavam mudos. Não fez diferença.
“Queremos o fim do regime”, gritavam as ruas.
Talvez não tenha sido o mais memorável
brado revolucionário, mas gritaram e gritaram e repetiram,
até derrotar a chuva de granadas de gás lacrimogêneo.
Vinham de todos os lados da cidade do Cairo,
chegavam sem parar, jovens de classe média de Gazira,
os pobres das favelas de Beaulak al-Daqrour, todos marchando
pelas pontes sobre o Nilo, como um exército. Acho que sim, são um exército.
A chuva de granadas de gás continuava sobre eles.
Tossiam e esfregavam os olhos e continuavam andando.
Muitos cobriram a cabeça e a boca com casacos e camisetas
, passando em fila pela frente de uma loja de sucos,
onde o dono esguichava limonada diretamente na boca dos passantes.
Suco de limão – antídoto contra os efeitos do
gás lacrimogêneo – escorria pela calçada e descia pelo esgoto.
Foi no Cairo, claro, mas protestos idênticos aconteceram por todo o Egito,
como em Suez, onde já há 13 egípcios mortos.
As manifestações não começaram só nas mesquitas,
mas também nas igrejas coptas. “Sou cristão, mas antes sou egípcio”
– disse-me um homem, Mina. “Quero que Mubarak se vá!”
E foi quando apareceram os primeiros bataggi sem uniforme,
abrindo caminho até a frente das fileiras da polícia uniformizada,
para atacar os manifestantes. Estavam armados com cassetetes de metal
– onde conseguiram? – e barras de ferro, e poderão ser julgados e condenados por agressão grave e assassinato, se o regime de Mubarak cair. São pervertidos. Vi um homem chicotear um jovem pelas costas,
com um longo cabo amarelo. O rapaz gritou de dor. Por toda a cidade
, os policiais uniformizados andam em pelotões, o sol refletindo no
visor dos capacetes. A multidão já deveria ter sido intimidada
, àquela altura, mas a polícia parecia feia, como pássaros encapuzado
s. E os manifestantes alcançaram a calçada da margem leste do Nilo.
Alguns turistas foram colhidos de surpresa no meio do espetáculo –
vi três senhoras de meia idade, numa das pontes do Nilo (os hotéis,
claro, não informaram os hóspedes sobre o que estava acontecendo –,
mas a polícia decidiu que fecharia a extremidade leste do viaduto.
Dividiram-se outra vez, para deixar passar as milícias não uniformizadas,
e esses brutamontes atacaram a primeira fileira dos manifestantes.
E foi quando choveu a maior quantidade de granadas de gás, centenas de granadas,
em vários pontos, contra a multidão que andava sem parar por todas as grandes vias
, em direção cidade. Os olhos ardem, e tosse-se horrivelmente, até perder o fôlego
. Alguns homens vomitavam nas soleiras das portas fechadas das lojas.
O fogo começou, ao que se sabe, noite passada, na sede do NDP,
Partido Democrático Nacional, partido de Mubarak. O governo impôs
um toque de recolher, e há relatos de tropas na cidade, sinal grave
de que a polícia pode ter perdido o controle dos acontecimentos.
Nos abrigamos no velho Café Riche, perto da Praça Telaat Harb,
restaurante e bar minúsculo, com garçons vestidos de azul; e ali,
tomando café, estava o grande escritor egípcio Ibrahim Abdul Meguid,
bem ali à nossa frente. Foi como dar de cara com Tolstoi, almoçando
em plena revolução russa. “Mubarak está sem reação!” – festejou ele.
“É como se nada estivesse acontecendo. Mas vai, agora vai.
O povo fará acontecer!” Sentamos, ainda tossindo e chorando
por causa do gás. Foi desses instantes memoráveis, que acontecem
mais em filmes que na vida real.
E havia um velho na calçada, cobrindo os olhos com a mão.
Coronel da reserva Weaam Salim do exército do Egito,
que saiu para a rua com todas as suas medalhas
da guerra de 1967 contra Israel – que o Egito perdeu –
e da guerra de 1973 que, para o coronel, o Egito venceu.
“Estou deixando o piquete dos soldados veteranos” – disse-me ele
. “Vou-me juntar aos manifestantes”. E o exército? Não se viram soldados
do exército durante todo o dia. Os coronéis e brigadeiros
mantêm-se em silêncio. Estarão à espera da lei marcial de Mubarak?
As multidões não obedeceram ao toque de recolher. Em Suez,
caminhões da polícia foram incendiados. Bem à frente
do meu hotel, tentaram jogar no rio Nilo um caminhão da Polícia.
Não consegui voltar à parte ocidental do Cairo pelas pontes.
As granadas de gás ainda empesteiam as margens do Nilo.
Mas um policial ficou com pena de nós –
emoção absolutamente inexistente, devo dizer, ontem,
entre os policiais – e nos guiou até a margem do rio.
E ali estava uma velha lancha egípcia a motor, de levar turistas,
com flores plásticas e proprietário disponível. Voltamos em grande estilo,
bebendo Pepsi. Cruzamos com uma lancha amarela, super rápida, da qua
l dois homens faziam sinais de vitória para a multidão sobre as pontes.
Uma jovem, sentada na parte de trás da lancha, carregava uma imensa bandeira: a bandeira do Egito.
Ver original em http://www.independent.co.uk/news/world/africa/robert-fisk-
a-people-defies-its-dictator-and-a-nations-future-is-in-the-balance-2197769.html.
a-people-defies-its-dictator-and-a-nations-future-is-in-the-balance-2197769.html.
=========================================================================================================
Robert Fisk
Egito: uma ditadura nas vascas da morte
30/1/2011, The Independent, UK
http://www.independent.co.uk/opinion/commentators/fisk/robert
-fisk-egypt-death-throes-of-a-dictatorship-2198444.html
Os tanques egípcios, os manifestantes em delírio sentados sobre eles,
as bandeiras, os 40 mil manifestantes lacrimejando
e gritando vivas na Praça da Liberdade e rezando
à volta dos tanques, um membro da Fraternidade Muçulmana
sentado entre os ocupantes do tanque. Pode-se talvez comparar
à libertação de Bucareste? Subi eu também sobre um tanque de combate
, e só conseguia pensar naqueles maravilhosos filmes da libertação de Paris
. A apenas algumas centenas de metros dali, os guardas
da segurança de Mubarak, nos uniformes pretos, ainda
atiravam contra manifestantes perto do ministério do Interior
. Foi celebração selvagem de vitória histórica, os tanques
de Mubarak libertando a capital de sua própria ditadura.
No mundo de pantomima de Mubarak – e de Barack Obama
e Hillary Clinton em Washington –, o homem que ainda
se diz presidente do Egito deu posse a um vice-presidente
cuja escolha não poderia ter sido pior, na tentativa de aplacar
a fúria dos manifestantes – Omar Suleiman, chefe-negociado
r do Egito com Israel e principal agente da
inteligência egípcia, 75 anos de idade e muitos de contatos
com Telavive e Jerusalém, além de quatro ataques cardíacos
. Não se sabe de que modo esse velho apparatchik doente
conseguiria enfrentar a fúria e a alegria de 80 milhões de egípcios
que se vão livrando de Mubarak. Quando falei a alguns manifestantes
ao meu lado sobre o tanque, da nomeação e posse de Suleiman
, houve gargalhadas.
Os soldados que conduzem os tanques,
em uniforme de combate, sorridentes e às vezes
aplaudindo os passantes, não fizeram qualquer
esforço para apagar das laterais dos tanques os graffiti
ali pintados com tinta spray. “Fora Mubarak! Caia fora, Mubarak!”
e “Mubarak, seu governo acabou” aparecem grafitados
em praticamente todos os tanques que se veem
pelas ruas do Cairo. Sobre um dos tanques que circulavam
pela Praça da Liberdade, vi um alto dirigente da Fraternidade Muçulmana
, Mohamed Beltagi. Antes, andei ao lado de um comboio
de tanques próximo de Garden City, subúrbio do Cairo
, onde as multidões subiram aos tanques para oferecer
laranjas aos soldados, aplaudindo-os como patriotas egípcios
. A nomeação ensandecida e sem sentido de um vice-presidente
[o primeiro, em 30 anos, e nomeação que significa que Mubarak
desistiu de nomear o filho para substituí-lo no poder (NTs)] e a formação
de um ‘novo’ Gabinete sem poder algum, constituído só de velhos conhecidos
dos egípcios, evidenciam que as ruas do Cairo viram e veem
o que nem os estrategistas e políticos dos EUA
e da União Europeia souberam ver: que o tempo de Mubarak acabou
.
As frágeis ameaças de Mubarak de que empregará
repressão violenta em nome do bem estar dos egípcios
– quando já se sabe que a sua própria polícia e suas milícias
são responsáveis pelos ataques mais violentos dos últimos cinco dias
– só geraram ainda mais fúria entre os manifestantes,
vítimas de 30 anos de ditadura várias vezes muito violenta.
Crescem as suspeitas de que os piores ataques da repressão
foram executados por milícias não uniformizadas – inclusive
o assassinato de 11 homens numa vila do interior do país nas últimas 24 horas –
, tentativa de dividir o movimento e criar suspeitas contra as intenções
democratizantes das manifestações contra o governo de Mubarak.
A destruição dos centros de comunicações
por grupos de homens mascarados – que se suspeita que tenha sido ordenada
por alguma agência da segurança de Mubarak – também parece ter sido obra
das milícias não uniformizadas que espancaram manifestantes.
Mas o incêndio de postos policiais no Cairo, Alexandria,
Suez e outras cidades não foram obra daquelas milícias.
No final da 6ª-feira, a 40 milhas do Cairo, na estrada para Alexandria
, havia grandes grupos de jovens em torno de fogueiras acesas no meio
da estrada e, quando os carros paravam, eram assaltados; os assaltantes
exigiam dólares, sempre muitos, em dinheiro. Ontem pela manhã, homens
armados roubavam carros, de dentro dos quais arrancavam motoristas
e passageiros, no centro do Cairo.
Infinitamente mais terrível foi o vandalismo
contra o Museu Nacional do Egito.
Depois que a polícia abandonou o serviço de segurança do museu,
houve invasão de saqueadores e vândalos, que roubaram
ou destruíram peças de 4 mil anos, múmias e peças
de madeira esculpida de valor inestimável –
barcos, esculpidos com todos os detalhes e a tripulação,
miniaturas magníficas, feitas para acompanhar os faraós na viagem pós-morte
. Vitrines que protegiam trajes milenares foram quebradas, os guardas pintados
de preto arrancados e depredados. Outra vez, é preciso registrar que há boatos
de que os próprios policiais destruíram o museu, antes de fugir na 6ª-feira à noite
. Lembrança fantasmagórica do museu de Bagdá em 2003. Bagdá
foi pior, a destruição foi mais total, mas mesmo assim foi terrível
o desastre do museu do Cairo.
Em minha jornada noturna da Cidade 6 de Outubro até a capital,
tive de diminuir a velocidade várias vezes, porque a estrada
está cheia de restos de veículos queimados. Havia destroços
e vidros quebrados pela estrada, e muitos policiais armados,
com rifles apontados para os faróis do meu carro.
Vi um jipe semidestruído. Os restos do equipamento da polícia
antitumulto que os manifestantes expulsaram da cidade do Cairo na 6ª-feira.
Os mesmos manifestantes que, ontem à noite, formavam
círculo gigantesco em torno da Praça da Liberdade para rezar
. Gritos de “Allah Alakbar” trovejavam pela cidade no ar da noite.
Há também quem clame por vingança. Uma equipe de jornalistas da
rede al-Jazeera encontrou 23 cadáveres em Alexandria, aparentemente
assassinados pela polícia. Vários tinham os rostos
horrivelmente mutilados. Outros onze cadáveres foram
encontrados no Cairo, cercados por parentes que gritavam por vingança contra a polícia.
No momento, Cairo salta em minutos da alegria para
a mais terrível fúria. Ontem pela manhã, andei
pela ponte do rio Nilo e vi as ruínas do prédio de
15 andares onde funcionava a sede do partido de Mubarak
, que foi incendiado. À frente, um imenso cartaz pregava os benefício
s que o partido trouxe ao Egito – imagens de estudantes
formados bem sucedidos, médicos e pleno emprego, promessa
s que o governo de Mubarak sempre repetiu e jamais cumpriu em 30 anos
– emoldurados pela fuligem, semiqueimados, pendentes
das janelas enegrecidas do prédio. Milhares de egípcios
andavam pela ponte e pelos acessos laterais para fotografar
o prédio ainda fumegante – e muitos saqueadores, a maioria velhos,
que tiravam de lá mesas e cadeiras.
No instante em que uma equipe de televisão escocesa
preparava-se para filmar as mesmas cenas, foi cercada
por várias pessoas que disseram que não tinham
o direito de filmar os incêndios, que os egípcios
são povo orgulhoso que não roubaria nem saquearia.
O assunto foi discutido várias vezes ao longo do dia:
se a imprensa teria ou não o direito de divulgar imagens sobre essa “libertação”,
que veiculassem ideias menos dignas do movimento. Mesmo assim,
os manifestantes mantinham-se cordiais e – apesar das declarações
acovardadas de Obama, na 6ª-feira à noite – não se viu nenhum,
nem qualquer mínimo sinal de hostilidade contra os EUA.
“Tudo que queremos, tudo, exclusivamente, é que Mubarak
vá-se daqui, que haja eleições que nos devolvam a liberdade
e a honra” – disse-me uma psiquiatra de 30 anos.
Por trás dela, multidões de jovens limpavam o leito da rua,
removendo restos de veículos e barreiras postas nas
intersecções e esquinas – releitura irônica do conhecido
ditado egípcio, de que os egípcios nunca varrerão as próprias ruas.
A alegação de Mubarak, de que as atuais demonstrações e
atos de delinqüência – a combinação foi tema do discurso
em que Mubarak declarou que não deixaria o Egito –
seriam parte de um “plano sinistro” é evidentemente o núcle
o de seu argumento, na tentativa de não perder o reconhecimento mundial.
De fato, a própria resposta de Obama – sobre
a necessidade de reformas e o fim da violência –
foi cópia exata de todas as mentiras que Mubarak
sempre usou para defender seu governo durante 30 anos
. Os egípcios riram de Obama – inclusive no Cairo,
depois de eleito – quando exigiu que os árabes abraçassem
a liberdade e a democracia. Mas até essas aspirações sumiram
completamente quando, na 6ª-feira, Obama assegurou
seu desconfortável e incomodado apoio ao presidente egípcio.
O problema é o de sempre: as linhas do poder e as linhas
da moralidade em Washington jamais convergem
quando os presidentes dos EUA têm de lidar com o Oriente Médio.
A liderança moral dos EUA cessa de existir quando
há confronto declarado entre o mundo árabe e Israel.
E o exército egípcio, desnecessário lembrar, é parte da equação.
Recebe de Washington mais de 1,3 bilhão de dólares de auxílio anual.
O comandante desse exército, general Tantawi – que casualmente estava
em Washington, quando a polícia tentava esmagar os manifestantes –
sempre foi muito amigo, pessoal, íntimo, de Mubarak. Não é bom sinal,
parece, pelo menos no futuro imediato.
Assim, a “libertação” do Cairo – onde houve notícias,
ontem à noite, de saques no hospital Qasr al-Aini –
ainda tem a andar, até a consumação.
O fim pode ser claro. A tragédia ainda não acabou.
Egito: uma ditadura nas vascas da morte
30/1/2011, The Independent, UK
http://www.independent.co.uk/opinion/commentators/fisk/robert
-fisk-egypt-death-throes-of-a-dictatorship-2198444.html
Os tanques egípcios, os manifestantes em delírio sentados sobre eles,
as bandeiras, os 40 mil manifestantes lacrimejando
e gritando vivas na Praça da Liberdade e rezando
à volta dos tanques, um membro da Fraternidade Muçulmana
sentado entre os ocupantes do tanque. Pode-se talvez comparar
à libertação de Bucareste? Subi eu também sobre um tanque de combate
, e só conseguia pensar naqueles maravilhosos filmes da libertação de Paris
. A apenas algumas centenas de metros dali, os guardas
da segurança de Mubarak, nos uniformes pretos, ainda
atiravam contra manifestantes perto do ministério do Interior
. Foi celebração selvagem de vitória histórica, os tanques
de Mubarak libertando a capital de sua própria ditadura.
No mundo de pantomima de Mubarak – e de Barack Obama
e Hillary Clinton em Washington –, o homem que ainda
se diz presidente do Egito deu posse a um vice-presidente
cuja escolha não poderia ter sido pior, na tentativa de aplacar
a fúria dos manifestantes – Omar Suleiman, chefe-negociado
r do Egito com Israel e principal agente da
inteligência egípcia, 75 anos de idade e muitos de contatos
com Telavive e Jerusalém, além de quatro ataques cardíacos
. Não se sabe de que modo esse velho apparatchik doente
conseguiria enfrentar a fúria e a alegria de 80 milhões de egípcios
que se vão livrando de Mubarak. Quando falei a alguns manifestantes
ao meu lado sobre o tanque, da nomeação e posse de Suleiman
, houve gargalhadas.
Os soldados que conduzem os tanques,
em uniforme de combate, sorridentes e às vezes
aplaudindo os passantes, não fizeram qualquer
esforço para apagar das laterais dos tanques os graffiti
ali pintados com tinta spray. “Fora Mubarak! Caia fora, Mubarak!”
e “Mubarak, seu governo acabou” aparecem grafitados
em praticamente todos os tanques que se veem
pelas ruas do Cairo. Sobre um dos tanques que circulavam
pela Praça da Liberdade, vi um alto dirigente da Fraternidade Muçulmana
, Mohamed Beltagi. Antes, andei ao lado de um comboio
de tanques próximo de Garden City, subúrbio do Cairo
, onde as multidões subiram aos tanques para oferecer
laranjas aos soldados, aplaudindo-os como patriotas egípcios
. A nomeação ensandecida e sem sentido de um vice-presidente
[o primeiro, em 30 anos, e nomeação que significa que Mubarak
desistiu de nomear o filho para substituí-lo no poder (NTs)] e a formação
de um ‘novo’ Gabinete sem poder algum, constituído só de velhos conhecidos
dos egípcios, evidenciam que as ruas do Cairo viram e veem
o que nem os estrategistas e políticos dos EUA
e da União Europeia souberam ver: que o tempo de Mubarak acabou
.
As frágeis ameaças de Mubarak de que empregará
repressão violenta em nome do bem estar dos egípcios
– quando já se sabe que a sua própria polícia e suas milícias
são responsáveis pelos ataques mais violentos dos últimos cinco dias
– só geraram ainda mais fúria entre os manifestantes,
vítimas de 30 anos de ditadura várias vezes muito violenta.
Crescem as suspeitas de que os piores ataques da repressão
foram executados por milícias não uniformizadas – inclusive
o assassinato de 11 homens numa vila do interior do país nas últimas 24 horas –
, tentativa de dividir o movimento e criar suspeitas contra as intenções
democratizantes das manifestações contra o governo de Mubarak.
A destruição dos centros de comunicações
por grupos de homens mascarados – que se suspeita que tenha sido ordenada
por alguma agência da segurança de Mubarak – também parece ter sido obra
das milícias não uniformizadas que espancaram manifestantes.
Mas o incêndio de postos policiais no Cairo, Alexandria,
Suez e outras cidades não foram obra daquelas milícias.
No final da 6ª-feira, a 40 milhas do Cairo, na estrada para Alexandria
, havia grandes grupos de jovens em torno de fogueiras acesas no meio
da estrada e, quando os carros paravam, eram assaltados; os assaltantes
exigiam dólares, sempre muitos, em dinheiro. Ontem pela manhã, homens
armados roubavam carros, de dentro dos quais arrancavam motoristas
e passageiros, no centro do Cairo.
Infinitamente mais terrível foi o vandalismo
contra o Museu Nacional do Egito.
Depois que a polícia abandonou o serviço de segurança do museu,
houve invasão de saqueadores e vândalos, que roubaram
ou destruíram peças de 4 mil anos, múmias e peças
de madeira esculpida de valor inestimável –
barcos, esculpidos com todos os detalhes e a tripulação,
miniaturas magníficas, feitas para acompanhar os faraós na viagem pós-morte
. Vitrines que protegiam trajes milenares foram quebradas, os guardas pintados
de preto arrancados e depredados. Outra vez, é preciso registrar que há boatos
de que os próprios policiais destruíram o museu, antes de fugir na 6ª-feira à noite
. Lembrança fantasmagórica do museu de Bagdá em 2003. Bagdá
foi pior, a destruição foi mais total, mas mesmo assim foi terrível
o desastre do museu do Cairo.
Em minha jornada noturna da Cidade 6 de Outubro até a capital,
tive de diminuir a velocidade várias vezes, porque a estrada
está cheia de restos de veículos queimados. Havia destroços
e vidros quebrados pela estrada, e muitos policiais armados,
com rifles apontados para os faróis do meu carro.
Vi um jipe semidestruído. Os restos do equipamento da polícia
antitumulto que os manifestantes expulsaram da cidade do Cairo na 6ª-feira.
Os mesmos manifestantes que, ontem à noite, formavam
círculo gigantesco em torno da Praça da Liberdade para rezar
. Gritos de “Allah Alakbar” trovejavam pela cidade no ar da noite.
Há também quem clame por vingança. Uma equipe de jornalistas da
rede al-Jazeera encontrou 23 cadáveres em Alexandria, aparentemente
assassinados pela polícia. Vários tinham os rostos
horrivelmente mutilados. Outros onze cadáveres foram
encontrados no Cairo, cercados por parentes que gritavam por vingança contra a polícia.
No momento, Cairo salta em minutos da alegria para
a mais terrível fúria. Ontem pela manhã, andei
pela ponte do rio Nilo e vi as ruínas do prédio de
15 andares onde funcionava a sede do partido de Mubarak
, que foi incendiado. À frente, um imenso cartaz pregava os benefício
s que o partido trouxe ao Egito – imagens de estudantes
formados bem sucedidos, médicos e pleno emprego, promessa
s que o governo de Mubarak sempre repetiu e jamais cumpriu em 30 anos
– emoldurados pela fuligem, semiqueimados, pendentes
das janelas enegrecidas do prédio. Milhares de egípcios
andavam pela ponte e pelos acessos laterais para fotografar
o prédio ainda fumegante – e muitos saqueadores, a maioria velhos,
que tiravam de lá mesas e cadeiras.
No instante em que uma equipe de televisão escocesa
preparava-se para filmar as mesmas cenas, foi cercada
por várias pessoas que disseram que não tinham
o direito de filmar os incêndios, que os egípcios
são povo orgulhoso que não roubaria nem saquearia.
O assunto foi discutido várias vezes ao longo do dia:
se a imprensa teria ou não o direito de divulgar imagens sobre essa “libertação”,
que veiculassem ideias menos dignas do movimento. Mesmo assim,
os manifestantes mantinham-se cordiais e – apesar das declarações
acovardadas de Obama, na 6ª-feira à noite – não se viu nenhum,
nem qualquer mínimo sinal de hostilidade contra os EUA.
“Tudo que queremos, tudo, exclusivamente, é que Mubarak
vá-se daqui, que haja eleições que nos devolvam a liberdade
e a honra” – disse-me uma psiquiatra de 30 anos.
Por trás dela, multidões de jovens limpavam o leito da rua,
removendo restos de veículos e barreiras postas nas
intersecções e esquinas – releitura irônica do conhecido
ditado egípcio, de que os egípcios nunca varrerão as próprias ruas.
A alegação de Mubarak, de que as atuais demonstrações e
atos de delinqüência – a combinação foi tema do discurso
em que Mubarak declarou que não deixaria o Egito –
seriam parte de um “plano sinistro” é evidentemente o núcle
o de seu argumento, na tentativa de não perder o reconhecimento mundial.
De fato, a própria resposta de Obama – sobre
a necessidade de reformas e o fim da violência –
foi cópia exata de todas as mentiras que Mubarak
sempre usou para defender seu governo durante 30 anos
. Os egípcios riram de Obama – inclusive no Cairo,
depois de eleito – quando exigiu que os árabes abraçassem
a liberdade e a democracia. Mas até essas aspirações sumiram
completamente quando, na 6ª-feira, Obama assegurou
seu desconfortável e incomodado apoio ao presidente egípcio.
O problema é o de sempre: as linhas do poder e as linhas
da moralidade em Washington jamais convergem
quando os presidentes dos EUA têm de lidar com o Oriente Médio.
A liderança moral dos EUA cessa de existir quando
há confronto declarado entre o mundo árabe e Israel.
E o exército egípcio, desnecessário lembrar, é parte da equação.
Recebe de Washington mais de 1,3 bilhão de dólares de auxílio anual.
O comandante desse exército, general Tantawi – que casualmente estava
em Washington, quando a polícia tentava esmagar os manifestantes –
sempre foi muito amigo, pessoal, íntimo, de Mubarak. Não é bom sinal,
parece, pelo menos no futuro imediato.
Assim, a “libertação” do Cairo – onde houve notícias,
ontem à noite, de saques no hospital Qasr al-Aini –
ainda tem a andar, até a consumação.
O fim pode ser claro. A tragédia ainda não acabou.
Subscrever:
Mensagens (Atom)